Nota sobre profissionais da saúde e corpolatria
Por Emanoela Sousa Lima
Rozelair Barreto da Silva
O corpo sempre visto como uma ferramenta para liberdade, como
expressão particular do ser, está se tornando um corpo privado, encarcerado e
imerso em sofrimento? Posto o questionamento, vemos que as escolhas feitas de
acordo com as experiências estabelecidas com o nosso corpo são bombardeadas por
conceitualizações e delineamentos estéticos.
Percebemos que há uma preocupação com o aspecto físico. Parece que
manter o corpo jovem dá ao indivíduo uma espécie de status ou condição elevada
perante os que não se enquadram nas mistificações que a mídia cria. É preciso
seguir à risca aquilo que as tendências midiáticas impõem. Cria-se, portanto,
para além das expectativas depositadas em um modelo de corpo perfeito, seres
que consomem todos os objetos possíveis para manter a padronização corporal
ditada.
Nesse contexto, qual o papel dos profissionais que lidam
diretamente com a corporeidade (?), a saber: personal trainner, nutricionistas,
fisioterapeutas, psicólogos, médicos, entre outros. Até que ponto estes
profissionais podem contribuir de forma crítica para as discussões atuais sobre
a corporeidade? Como eles são utilizados pela mídia para comercialização de
produtos a favor do mercado corpolátrico?
Conforme afirma Lima (2009) “há a necessidade da formação
de um profissional crítico, que possa com as suas intervenções mudar esse
quadro atual relacionado à saúde e atividade física”. Deste modo, há de, cada
vez mais, se combater a formação de grupos que reafirmam a busca por esse ideal
de corpo e acabam por excluir ou posicionar “o de fora” como estranho. Pois, o
narcisismo tende a ser um traço central na vida dos indivíduos corpólatras,
refletindo o egoísmo reinante e uma estrutura social que prioriza a matéria
acima dos valores espirituais e culturais (Lima, 2009, p.1068).
Os profissionais devem então, a partir dessa
contemporaneidade que pauta suas ações em algumas práticas excessivas e
excludentes, promover o bem-estar e a noção de alteridade, o que de acordo com
Pelizzoli (2014) é “a aceitação do outro como outro, em sua diferença,
estranheza, não-eu, fora do meu gueto ou grupo” (p.25). Logo, essa não
aceitação do outro, põe em xeque a não aceitação ou não reconhecimento de si,
por isso a importância de reconhecê-lo como tal e em sua relação com o próprio
corpo.
Diante
do pressuposto faz-se necessário repensar as relações de ser-cliente-profissional
onde esteja presente a autenticidade e o respeito ao cuidar desse corpo que não
é apenas um espaço de culto à beleza. O profissional que lida com a
corporeidade precisa pautar sua prática na compreensão do ser em sua
integralidade. Como proposto por Merleau Ponty, o organismo e o comportamento
humano precisam ser entendidos a partir de três níveis: o físico, o biológico e
o mental; esses níveis são irredutíveis um ao outro (Coelho & Carmo, 1992,
p. 42).
Em
vista disso os profissionais da saúde, em particular o personal trainner,
apesar de deter o conhecimento e a técnica, devido a sua formação, visibilidade
e credibilidade, tem o desafio de desmitificar essa cultura de mercadorização
da saúde e do bem-estar físico. Sendo, muitas vezes, pressionado ao tomar uma
postura contrária aos modelos socialmente impostos, já que existe um sentimento de status ao estar sob a supervisão do
profissional da saúde.
Dicas de leitura:
- Coelho, N.; Carmo, P.S. Merleau-Ponty, filosofia como corpo e
existência.
- Barreto, A.F. Práticas integrativas em saúde: proposições
teóricas e experiências na saúde e educação. Ed. UFPE, 2014.
-
LIMA, M. M. (2009). Mercadorização do corpo, corpolatria e o papel do
profissional de educação física. Estudos,
36 (9/10), p. 1061-1071.
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