Por Ravena Araújo e Thâmara Agnes da Silva Santos
A
grande problemática do contexto social e que se materializa no âmbito escolar é
a visão de um corpo que é fragmentado, compreendido apenas enquanto corpo
orgânico e totalmente desconectado da mente. Na realidade escolar esse corpo é
esfacelado pelas ciências biológicas, negligenciado por outras disciplinas e
por fim apropriado indevidamente pela Educação Física, que não o compreende em
sua totalidade mas de maneira orgânica.
Para
discutir e refletir acerca do corpo é importante pensar a respeito das seguintes questões: Qual
importância da escola no contexto social e vice-versa? De que forma as instituições
escolares, que servem de processo formador do pensamento social e, esperasse crítico,
tem lidado com as questões de gênero? E como essa concepção de corpo
biológico na Educação física infere nas relações de gênero?
Sabemos que no contexto escolar os meninos são encorajados
a determinadas atividades e meninas desencorajadas a outras. Até que ponto isso
reflete no desenvolvimento de habilidades motoras e posteriormente é
naturalizado como incapacidade feminina e capacidade masculina? Louro
(2003) aponta, "a escola não apenas reproduz ou reflete as concepções de
gênero e sexualidade que circulam na sociedade, mas que ela própria as
produz". O produto final, então, são diferenças hierarquizadas.
“A escola atua
em seu papel de instituidora de identidades, ditando não apenas comportamentos,
concepções e atitudes a seus alunos, mas também classificando e punindo aqueles
desviantes do que é considerado normal” (LOURO, 2003; MEYER, 2003). Qual então
é o papel do professor e será que ele está preparado para esse espaço? Os
espaços escolares, ainda na contemporaneidade, são padronizados, nas salas de
aula as cadeiras permanecem enfileiradas, de modo que os corpos permaneçam
imóveis. O papel do professor é adestrar esses corpos, e em nenhum momento
reflete-se sobre o corpo enquanto construção social, como lugar de existência
que atribui significados ao mundo e
ao ser.
A passos curtos e diante de muita luta a sociedade vem
sendo modificada, mas é preciso refletir, criticar e questionar, por que noções
de gênero são representações atribuídas ao homem e mulher, por cada sociedade.
E como a nossa sociedade veem construindo essas representações? Qual o lugar da
escola nesse contexto? E como são
tratados estes sujeitos que são seus corpos, mas os entende enquanto
propriedade orgânica? E como ela contribui para reforçar o machismo, excluir-menosprezar
as meninas e tudo que difere do padrão gênero/sexo/sexualidade?
Estamos construindo formadores de opinião, conscientes das suas existências, que
se responsabilizam por suas escolhas ou papeis sociais que se
vitimizam e culpabilizam a sociedade? Seres apreendidos em seus corpos ou
alheios a eles impedidos existencialmente
de exercerem sua liberdade?
São perguntas provocativas com objetivo de fazer pensar
sobre a nossas ideologias.
Segundo Louro, 1997 “Gênero não é sinônimo de sexo”. Há meninas
que querem jogar futebol, basquete, brincar de carrinho, há meninos que não
querem, que querem jogar “boleado”, fazer ginastica, brincar com bonecas, e
dai? Qual o problema? O crucial é desconstruir corpos biológicos
que excluem um gênero de determinadas atividades, o corpo é potencialmente e
igualmente capaz, mas para além, somos corpos de possibilidade, produtores de significação do mundo. A limitação é
inerente ao humano e não ao gênero. É preciso ter um novo olhar de cuidado para a formação dos nossos
estudantes, do humano que é
possibilidade e potencial. O cuidado com a educação sexista que minimiza a
mulher e legitima a dominação masculina, que culpabilidade a orientação afetiva
ou a expressão corporal de crianças que talvez ainda nem entendam as diferenças
de gênero. É preciso conviver com as condições de possibilidades do humano,
permitir a liberdade de escolha para
cada corpo, diminuir as desigualdades e acima de tudo se relacionar não com o
sexo, o corpo biológico, os papeis sociais, mas com pessoas.
O
problema dos preconceitos segundo Casanova é que eles inviabilizam a experiência que é constitutiva do
pensamento filosófico, e que ao mesmo tempo prejudica as experiências. Quais as
possibilidades? Se aprisionar no tempo? Talvez reconstruir, mobilizar, refletir
sobre esse tempo diante dos nossos próprios impactos, e o tempo se rearticula
na essência com o ser.
Indicações de ambos os textos:
LOURO, Guacira
Lopes. Um Corpo Estranho – Ensaios
sobre sexualidade e teoria queer. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2004, 92
p.
LOPES, Maycon
Silva. Notas para uma fenomenologia queer. In: II Encontro Baiano de Estudos em
Cultura, 2009. Anais do II EBECULT.
CORSINO,
Luciano Nascimento. Relações de gênero na Educação Física: a construção dos
corpos de meninas e meninos nas "misturas" e nas separações da
escola. 2010.
ROEHE, Marcelo
Vial and DUTRA, Elza.Dasein, o
entendimento de Heidegger sobre o modo de ser humano. Av. Psicol.
Latinoam. [online]. 2014, vol.32, n.1, pp. 105-113.
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