Amor e cuidado

Por Erika Hofling Epiphanio

Nas últimas semanas me debrucei em estudar o “tema” cuidado na perspectiva do existencialismo, mais precisamente de Heidegger.
Estes estudos se deram devido ao necessário embasamento teórico para projetos e artigos, bem como para discussão da temática na disciplina Psicologia Fenomenológica-existencial II que ministro ao 3º período do curso de Psicologia da UNIVASF.
Após corrigir textos produzidos por meus alunos sobre o cuidado após experiências em um evento científico e após assistirmos diversos vídeos que tratam o cuidar e ser cuidado por diversas maneiras, me vi pensativa refletindo sobre AMOR e CUIDADO.
Com este “cutucador” existencial minhas memórias aguçaram-se para pensar nas experiências registradas com minha intencionalidade* tanto de situações e relações por mim vivenciadas nas esferas profissionais, afetivas e de autocuidado, assim como histórias que me foram compartilhadas e que hoje, de alguma forma, fazem parte de meu ser, uma vez que habitam minha memória.
Fiquei pensando na falta de cuidado que muitas vezes as pessoas possuem com o que amam, parecendo até um lapso existencial frequente nas relações atuais. O que me chega como uma nostálgica reflexão que, em geral, quando as pessoas estão em luto a maior dor vem do que não pode ser vivido, das frases que não foram ditas, do carinho que não foi manifesto, enfim, do cuidado não dispensado àquele a que se despede da existência. Por outro lado, aqueles que se dedicaram ao cuidar verdadeiro e comprometido, sentem-se mais leves e com isto a dor da perda se alivia, mas óbvio que não cessa.
Este luto é mais perceptível ao se falar da morte de um Ente amado, mas gostaria aqui de provocar uma ampliação desta perspectiva, podendo indicar o luto pela perda de nossa saúde, de um trabalho ou ao vivenciar um fracasso profissional.
Ao amar ao outro é fundamental o desenvolvimento de uma relação de cuidado, cuidado ao nos implicar com o outro, cuidado ao nos permitirmos sermos nós para que o outro se revele. Cuidado com as palavras, pois palavras podem ferir, ao mesmo tempo que aliviam uma dor. O cuidar do outro é empático. No entanto, cuidar na relação com outro também indica o se cuidar e se manter na sua integridade do seu ser. Quem ama, se cuida, esta uma frase que gosto muito de usar para expressar minha visão do autocuidado na relação com o outro.
O amor ao trabalho é o que faz com que nos dediquemos para o sentido do nosso fazer, seja qual for o trabalho, ele terá sucesso se houver empenho, sentido, cuidado e amor. Este cuidado também é no dosar a medida saudável de dedicação. É cuidar para que o tédio, a mesmice e a comodidade não nos retirem o amor ao trabalho, pois o fracasso, geralmente, está associado as vibrações negativas que colocamos no ofício.
Um outro ponto que vale uma reflexão é o cuidado ao mundo que habitamos. Na perspectiva da Fenomenologia e do Existencialismo ao se compreender o Ser, se torna necessário compreende-lo na relação com o mundo (ser-no-mundo) e aí vem, acredito eu, um dos maiores lapsos existenciais, pois qual o cuidado que a humanidade tem tido com o mundo que habita? O homem na busca pelo poder negligencia o seu próprio mundo e destrói as relações humanas, também considerada por estas perspectivas teóricas condição humana essencial. É, acredito que o mundo carece de cuidado, assim como a humanidade, sendo que cuidar do mundo também significa cuidar de si.
E assim,  passa  a ser relevante se pensar no amor próprio. O amor que tenho pelo meu Ser é o que me faz me cuidar, atendo-me as doses certas de alimentação, cuidados com o corpo, com o trabalho, relacionamentos, etc Em geral, adoecemos por não nos cuidarmos adequadamente. Ninguém é capaz de cuidar do nosso Eu. Com o afeto do outro, com boas relações de trabalho e boas relações afetivas fica mais fácil, mais aprazível o autocuidado, mas este é o NOSSO dever com o NOSSO AMOR PRÓPRIO. Viver o luto por nossa saúde que não está bem é uma grande dor.
Assim fica a reflexão: será que que estamos nos cuidando bem e cuidando do que amamos?



Uma imagem de um pai que soube amar e cuidar. Que dedicou sua vida ao cuidado de sua família, dos seus pacientes e de suas orquídeas (sua grande paixão). Dr. Humberto, meu pai, alguém por quem dediquei muito de minha existência para estar ao seu lado, aliviando um pouco da imensa dor quando ele encontrou o fim de sua existência. Seu cuidado ainda me invade com seu amor.

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