por Tereza
Raquel da Silva Santos
Me surpreendi ao descobrir que a escola do
projeto Com-versando era no meu bairro, não apenas a surpresa pela
coincidência, mas a surpresa em ver que algo tão significativo chegaria a uma
população que não tem acesso ao mínimo, uma comunidade que não sabe que tem
direito a ser cuidada. E foi ali na inserção no Paulo Freire que eu pude
perceber que apesar de morar há anos naquele bairro periférico eu estava
distante e alheia aquela realidade. Bem como diz o filósofo e imperador romano
Marco Aurélio em suas meditações: “Um ramo que se separa do seu vizinho, também
se separa da árvore inteira. De igual modo, um homem, ao ficar separado de um
homem, ficou excluído da humanidade inteira”, ao estar separado de sua
comunidade, cada família, criança, pai, mãe, perderá o sentimento de pertença,
perderá um pouco da sua identidade. É por isso que se faz importante a entrada
do projeto na comunidade, porque compreende a escola a partir da sua própria
perspectiva, do seu próprio lugar no mundo.
As rodas de reflexão, movimentações na
escola e diálogos esporádicos me fizeram lembrar de quando eu morava vizinha à
igreja e meu pai fazia amizade com os meninos que usavam drogas na quadra de
futebol, ele tentava inseri-los nos grupos de oração da igreja, mostrar uma
nova perspectiva de vida. É um bairro estigmatizado pela violência, drogas e
vulnerabilidade da sua população. Há muito se investiga como esse estado de
vulnerabilidade impacta os vários aspectos da vida humana, como é nocivo não
ter a garantia do mínimo para ter uma vida digna. E de fato, negar o estado de
carência a certas comunidades é negar o acesso ao cuidado e atenção. Hoje em
dia, quando vejo as crianças brincando na rua e lembro que eu brincava naquela
mesma rua, quando o meu vizinho que passa o dia sentado na sua calçada me
sinaliza para andar pela sombra quando volto da faculdade, eu me questiono se este
é um bairro “carente”, se não poderíamos reformular a nossa definição de
riqueza.
Não muito antigamente haviam policiais de
prontidão na avenida principal, isso graças ao grande movimento do tráfico que
acontecia, os jovens passavam armados na rua e volta e meia chegava a notícia
de que tinham sido mortos pelo tráfico ou por desentendimentos. Mas hoje,
apesar de boa parte da população ainda se encontrar em estado de pobreza, o
tráfico não tem mais aquela força, olho para aquelas crianças da Escola Paulo Freire
e penso a coisa mais importante que pode ser ofertado a elas não envolve coisas
materiais, mas a mesma coisa que me deram quando eu era criança, o direito de
sonhar, uma perspectiva, saber que o futuro pode ser um lugar seguro. O maior
ato de cuidado é dar ao outro o direito de ser quem é e alimentar os seus
sonhos e quando esse outro é uma criança isso se torna a nossa obrigação.
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