Universidade e os diálogos com a Educação.


Por Erika Hofling Epiphanio

Nos últimos tempos, temos convivido com intensos debates sobre o papel da Universidade para a Sociedade, sendo foco de ataques atuais, as consideradas áreas de humanidades, como se estas áreas não contribuíssem de forma direta com a sociedade em que vivemos.
Este texto está longe de trazer um posicionamento político, muito menos partidário, uma vez que mantenho este posicionamento reservado à minha intimidade. No entanto, este texto tem como intenção compartilhar com nossos leitores de que forma temos construídos diálogos pertinentes e necessários entre conhecimentos produzidos no âmbito da Universidade com a Educação básica na região em que trabalhamos.
Então vamos relatar aqui algumas ações realizadas pelo NEPFEE que sustentam parcerias bem estabelecidas entre a Universidade Federal do Vale do São Francisco e  escolas públicas da região do Vale do São Francisco.
Em 2015, iniciei uma parceria com uma escola pública de Juazeiro, em que indiquei estagiários de psicologia para ofertar o serviço de plantão psicológico naquela escola, acolhendo demandas de sofrimento de estudantes, professores, servidores e familiares. Devido ao conteúdo ouvido neste contexto, comecei a construir um olhar mais ampliado desta escuta, propondo algumas rodas de conversas tanto com estudantes como com professores da mesma escola, a fim de dialogar sobre temas que se mostravam emergentes. Desde então, o serviço de plantão psicológico se estendeu para mais duas escolas oferecendo apoio e acolhimento à comunidade escolar. Sendo que, no momento, estamos em processo de levantamento de dados das demandas e queixas destes quatro anos de escuta em escolas, para termos uma compreensão mais amplificada para pensarmos em estratégias de enfrentamento para tais dores, podendo ser, que este levantamento auxilie na criação de políticas públicas que atendam as demandas de sofrimento escolar, favorecendo estratégias preventivas para o adoecimento psíquico na nossa sociedade.
Também no intuito de ampliar esta compreensão entre 2016 e 2017, desenvolvemos uma pesquisa que buscava compreender o sofrimento presente na educação de Petrolina. Esta pesquisa teve o apoio da Secretaria da Educação do Município, da qual indicou as escolas colaboradoras e no final da investigação receberam uma devolutiva dos dados encontrados, assim como as escolas colaboradoras. (Temos outro post publicado no nosso Blog que fala desta ação)
Em 2017, como devolutiva à sociedade iniciamos o projeto Com-versando, que é um projeto de extensão que leva escuta, acolhimento, cuidado e diálogo ao ambiente escolar.
E assim, outras inquietações surgiram em função do conteúdo escutado nas escolas que nos revelam necessidades de atuação na Educação. Uma delas fala sobre a necessidade de compreensão dos comportamentos autodestrutivos em jovens, algo que tem sido bastante presente no ambiente escolar, o que nos levou a iniciar outra pesquisa que busca tal compreensão em parceria com o professor Marcelo Ribeiro também do colegiado de Psicologia da UNIVASF que também tem estudado tal fenômeno.
Na pesquisa que estou realizando tivemos um levantamento dos casos encontrados no CEPPSI (Clinica escola da UNIVASF) e atualmente estamos realizando intervenções em um grupo de jovens com tal perfil de comportamento. Também como ação do nosso projeto, realizamos no dia 11 de março deste ano, um debate intitulado “Comportamentos autolesivos e adolescência: reflexões no âmbito da educação e saúde” conduzido por Erika Epiphanio (NEPFEE), Marcelo Ribeiro (NUPIE) e Virginia Alves Passos, todos do colegiado de Psicologia. Este debate teve uma importante articulação com a Secretaria da Educação de Petrolina, que conseguiu mobilizar diversos gestores, professores e técnicos que atuam diretamente com a educação. Foi um encontro muito proveitoso, pois além de ser um espaço de reflexão para os estudantes da Universidade, também se tratou de um espaço de diálogos com diversos profissionais que enfrentam em seu dia-a-dia situações, muitas vezes, que não fazem ideia de como agir, tendo neste espaço promovido na Universidade um suporte para tais enfrentamentos.  




No dia 25 de março, mais uma vez a Universidade (UNIVASF) recebeu diversos atores das escolas publicas da região, profissionais da saúde e estudantes para debater sobre “A Psicologia do Desastre: contexto escolares”, mais uma ação do NEPFEE, juntamente com o NUPIE, em que pudemos dialogar sobre a violência na escola e na sociedade. Neste debate tivemos a presença de Profa. Erika Epiphanio do NEPFEE, do prof. Marcelo Ribeiro e Melina Pereira do NUPIE e de profa. Shirley Macedo e Virginia Passos e novamente professores, gestores e profissionais da Secretaria da Educação encontraram um espaço de diálogo e desabafo das angústias vivenciadas nas escolas.
Com estes dois momentos na Universidade pudemos concluir que temos que pensar nestes fenômenos, de violência ao outro, ou violência a si mesmo, como fenômenos multifatoriais, que de certa forma refletem algo da sociedade em que fazemos parte. Fala de um mundo que pouco acolhe e em que o desrespeito à diversidade é predominante nas relações sociais.  Em um mundo em que “não ser aceito como se é”, a dor se torna silêncio!

Tenho pensado muito ultimamente no papel fundamental que a escola tem na construção dos indivíduos que compõe nossa sociedade. Tenho me deparado com uma realidade triste de que cada vez menos as famílias tem dado conta de exercer este papel, devido a situações de grande vulnerabilidade social e afetiva.  E ainda, os jovens trazem em suas expressões a dor, a dor não ouvida, não acolhida e muitas vezes não respeitada. São jovens que relatam que para serem aceitos no ambiente escolar eles devem agir de forma violenta com os outros, apontando para a predominância de relações tóxicas nas escolas.  E é neste ambiente de negligência de cuidado e ausência de respeito que nossas crianças e jovens se constituem como cidadãos.  

A seguir relatos de duas ações realizadas nas escolas em que temos o projeto Com-versando e o plantão psicológico. A Universidade também vai à escola!

No dia 17 de abril, estivemos com ações de cuidado e diálogo na escola Paulo Freire, em Petrolina, escola parceira do Projeto Com-versando. Nesta data havia um dia destinado ao planejamento docente daquela instituição e para este evento oferecemos dois momento para os professores. No primeiro momento as ações foram destinadas ao cuidado do professor.
O dia começou com uma oficina de Yoga, ministrada por Sofia, mais uma parceira na rede de cuidado construído pelo Com-versando. Muitos puderam participar e relaxar um pouco antes do árduo trabalho do dia. 


Também tivemos a presença de Clara Souza, que também é fundadora do NEPFEE que  proporcionou um encontro com o tema Elogio do cuidado, em que os professores puderam inspirar-se de cuidado.




No período da tarde, mais dois encontros com os professores, afim de promover  reflexões necessárias à prática docente.

A primeira roda versava sobre a Comunicação não-violenta e a escola. A psicologia Camila Duarte, foi a facilitadora do encontro e pode dialogar com professores e servidores da escola sobre possibilidade de comunicação para com o ambiente escolar.
E ainda a professora Erika Epiphanio coordenadora do projeto Com-versando, juntamente com o professor Marcelo Ribeiro facilitaram uma roda com o tema “Manejo do comportamento autolesivo no ambiente escolar”



O mesmo tema foi debatido na escola CODEFAS, na cidade de Juazeiro no último sábado dia 27 de abril, que a pedidos da gestão da escola, a professora Erika juntamente com alguns estagiários conversaram com os professores sobre o acolhimento da dor dos estudantes.

Foram experiências que me ajudam a expandir as compreensões sobre relações, cuidado, acolhimento e solidariedade e seu impacto no contexto escolar.
Foram debates muito ricos, em que o conhecimento produzido no âmbito da Universidade Pública se transforma em ações à sociedade, são momentos como este, em que oferece sentido ao que se produz na Universidade. São espaços promotores de reflexões que provavelmente geram ações que possam transformar a dura e triste realidade de muitas crianças, jovens e professores que sofrem e que muitas vezes não são assistidos em suas dores, por falta de conhecimento e de cuidado.
A dor do outro não é quantificável e nunca deve ser desqualificada. A dor silenciada por comportamentos autodestrutivos não é “frescura” e nem modismo. Toda dor merece atenção e cuidado, inclusive a dor do professor que se sente impotente diante do sofrimento de seus alunos.
Todas as ações realizadas neste diálogo  entre o que ocorre no ambiente escolar e o que se produz nas Universidades, nos revelam a urgência de construirmos escolas vivas, que valorizem as relações e que a solidariedade seja experimentada como possibilidade e modelo.
Então, que a Universidade continue desenvolvendo saberes que possam contribuir para que as relações humanas se tornem caminhos profícuos de transformação social!





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